
Juntei todo o meu dinheiro.
Mesmo não sendo muito,consegui comprar um terreno em Marte.
Só pra ter onde levar minha mente, nessas tantas vezes em que ela viaja e ultrapassa o céu, vaga sem rumo pelo universo e invariavelmente acaba ali: no quarto planeta a contar do Sol, onde ninguém pensa em ir.
A única coisa que deveria me preocupar é justamente a que me deixa mais calma: a gravidade.Ou a falta dela, se preferir.
Me faz pensar em como tudo poderia ser mais fácil se eu também fosse gravitacional: a egoísta força gravitacional que puxa tudo pro centro da Terra.
Mas em Marte, não preciso de nada disso: vejo todos os meus objetivos e desejos flutuando ao alcance das minhas mãos, e não existe dor, arrependimento ou lágrimas.
Não existe quem questione o silêncio repentino que me invade ás vezes, mas que é só externo. Por dentro, sou confusão em tempo integral.
Silêncio: Não me invade quando não tenho o que dizer: me invade quando tenho tantas palavras engasgadas que não consigo organizá-las, e sei que mesmo que as organizasse, ainda fariam pouco ou nenhum sentido.
Em Marte, ainda não existem espelhos, nem mesmo rios ou poças d'água que reflitam minha imagem, mas eu não precisaria de nada pra perceber meu constante sorriso. Porque os músculos dos lábios chegam a doer.
Melhor do que sorrir nesse paraíso escarlate é não precisar de causa pra esse sorriso; não ter a quem culpar, na falta dele.
Aprender a viver de dentro pra fora e só pra mim, por mim.
Ás vezes sinto saudade do barulho ensurdecedor da Terra.
O som não se propaga no vácuo, mas tenho certeza de que se isso fosse possível, eu ouviria daqui. As buzinas, o trânsito caótico, os gritos.
Inclusive as gargalhadas.
Pra preencher a falta dessa insanidade terrestre, fico aqui, deitada,olhando pro céu.
Daqui, a única coisa que me resta é o espetáculo a que nos submetemos desde o início dos tempos: Olhar as estrelas. Converso com elas, sem falar. Volto no tempo e me lembro dos livros escolares em que era preciso ligar os pontinhos pra que um desenho se formasse: É tão mais interessante fazer isso com pontos cintilantes e linhas imaginárias!
Queria viver aqui. Mas sem mantimentos, sem supermercados,farmácias, e todo esse comércio a que aprendemos a ser dependentes, seria impossível.
Além disso, as pessoas tem medo de vir pra cá. É tão confortante que não dá vontade de voltar.
Mas é preciso voltar.
Não quero superlotação em Marte. Não quero vizinhos.
Não quero companhia.
Não quero nada.
Quero paz.
Muito bom, suas palavras ganharam vida em meus olhos. Da terra, em meio ao caos que reina nos poros do chão, te mandaria notícias. Mas nada muda por aqui (até muda), ainda falamos sobre modas e sentimentos superficiais, daqueles que não penetram na pele, sabe? É como uma picada de pernilongo, mas o que me faz vibrar mesmo, são sentimentos em ponta de agulha, daquelas que dizem "é só uma picadinha" mas te amolece, me amolece, durmo, morro, vivo. Marte, é longe?
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