-Aliste-se.Isso lhe dará algo sobre o que escrever.
-Becker,há sempre algo sobre o que escrever.

Charles Bukowski- Misto Quente.

2 de jul. de 2011

Atônito, Eu.

Eu não devia ter feito a tal pergunta.
Pra mim.
"No fim das contas, quem é você? Qual sua cor favorita? Que tipo de gente mais te atrai? Que tipo de carro, música, comida? Travesseiro? Que feriado que 'cê mais gosta?
Melhor roupa, melhor amigo, melhor viagem, melhor foda?
Arroz polido ou parboililizado?
10,20,30 ou 60 vezes?"

Não. Não tinha nada a ver com isso. O buraco era muito mais embaixo. Debaixo de cada pelezinha, de cada casquinha, tem um treco que sabe tudo de você, e você não sabe nada desse treco.
Pode se passar uma vida inteira sem se perguntar e sem saber, e ainda assim não restar dúvida de que tudo 'tá certo, no seu devido lugar.
Tem um negócio chamado espelho. Serve pra gente conferir se tá tudo certo com a gente.
Cabelo, rugas, olheiras, roupa.
Mas é aí que você pode acabar se estrepando. Num mínimo instante, você acaba se esbarrando é consigo mesmo, e se olhar o fundo dos olhos estáticos na sua frente,
vai sentir fulminar a única pergunta que talvez importe no final de todas as coisas.
Nessa hora, você pode fingir pro espelho que não viu nada. E que o buraco negro que você acabou de vislumbrar é o seu simples reflexo numa superfície fria.
Vai dormir que nem um neném.
E acordar salvo, pra viver mais um dos dias, que apesar de conhecer tão bem,
no fundo no fundo sabe que não tem qualquer sentido.


Ou pode mergulhar no abismo.
E mesmo apavorado, vai saber que ali, num lugar que 'cê nunca visitou,
talvez você encontre você mesmo.
Cores, gente, carros, música, comida... fodas. Não tem nada disso ali.
E é isso que dá medo.
E uma interrogação se crava brutalmente no meio da sua cabeça:
Você sabe porquê tá aqui?

Dá pra ficar maluco. Até chega a se arrepender.
Vê que não sabe nada,
nada,
n
a
d
a
.

E que por isso, o mundo devia ser feito de muito mais pergunta que resposta.
Nessa hora você se sente a coisa mais pelada do Universo,
sem camada sobre camada,
se sente sem sentido porque pela primeira vez você acorda.
Pode até parecer agoniante por um tempo,
mas quando começa a entender, vem um soco de luz e mostra que o abismo é, na verdade, um espaço infinito.
Cada personagenzinho que você é vai se pulverizando, você se sente inseguro com a possibilidade de ver o que tá ali, por trás de tudo,
mas vê.
Pode até doer,
mas passa.
E quando passa... Seu mundinho pequeno de antes já não cabe onde cabia,
e você sente pela primeira vez pegar de verdade nas rédeas de si mesmo,
e se levar pra onde quiser.
No fim das contas,

quem é você?


2 comentários:

  1. Apesar da sua inconstância nas postagens, a recompensa nunca falha, seus textos são incríveis, de maneira alguma perdem o fio da meada, sempre tão diretos e tão envolventes, sempre tão apaixonantes..

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  2. Adorei o curta! Tanto o texto quanto a câmera muitas vezes minimalista. Ah, e por causa do curta acabei te achando lá no Filmow hahaha me adiciona lá!

    Um beijo!

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